Tirei
essa frase de um livro maravilhoso que ganhei. Se chama “365 dias – frases para
mulheres”. É uma coletânea de frases do meu mestre, o Dr. Daisaku Ikeda.
Estava
bem ali, na data de hoje (é daquele tipo de livrinho onde você tem uma mensagem
por dia).
Como
coincidências não existem, não foi à toa que a frase se encaixou perfeitamente
no assunto que eu tinha em mente para essa semana: ser ou não ser assumida?
Eis a
questão…
Como tudo
na vida, isso também é relativo.
No meu
caso foi indolor e tranquilo. Mas sou exceção, não a regra. E confesso que
tenho uma boa sorte incrível.
Explico:
nasci numa família muito inusitada. O que quero dizer com isso? Fui criada para
não ter preconceitos. Para dar importância a quem eu era e o que realmente
queria, não importando o que os outros fossem pensar.
Outro
ponto fundamental: a minha primeira experiência com uma mulher não foi movida
apenas por atração sexual. Eu estava apaixonada. Melhor ainda: era correspondida.
Foi meu primeiro amor, primeira namorada e primeira esposa.
Estudávamos
numa faculdade de teatro. Ser hetero era uma desvantagem. Lembro que ficamos no
meu quarto ligando para todos os amigos gays (eram a maioria) contando a
novidade. Eles ficavam felizes, uma coisa meio: “bem vindas ao nosso lado!”
Passamos
a ser convidadas para festas que antes (por sermos hetero) não éramos chamadas.
(É, preconceito é uma via de mão dupla, não é verdade? Mas esse é um assunto
sobre o qual ainda vou falar.)
Contar
para minha família (minha irmã e meu pai – minha mãe e meus avós já tinham
falecido) também não foi nada demais. Os dois acharam absolutamente normal.
Minha
melhor amiga? Aquela que me conhecia desde os 13 anos? Não é à toa que é minha
melhor amiga, não é verdade? Tinha acabado de conhecer um cara maravilhoso (e
era mesmo, tanto que ficaram 12 anos casados). Saímos a quatro.
Num certo
momento levantamos da mesa e fomos juntas ao banheiro (clássico!). Perguntamos
ao mesmo tempo:
- O que
você achou?
Voltamos
rindo, com os novos amores aprovados.
Tudo isso
facilitou a minha vida. E como!
Pensem:
não tive problemas em me assumir para mim, nem para os meus amigos, muito menos
para a minha família…
Perfeito! Ou quase…
A família
da minha primeira namorada não era assim tão liberal. Fui apresentada como
amiga. Mas era difícil, quase impossível disfarçarmos. Até porque mãe que é mãe
sempre sabe…
Começaram
a desconfiar. Ficávamos juntas tempo demais.
Dormíamos juntas vezes demais
(umas 5 vezes por semana, alternando as casas).
Muitas
vezes tive que entrar no apartamento dos pais dela me esgueirando quando todos
estavam dormindo. Outras me esconder debaixo da cama quando alguém batia na
porta do quarto. Fazer amor do tipo “filhos do silêncio” onde o máximo que se pode
fazer – com muito cuidado – é sussurrar no ouvido muito, mas muito baixinho.
Até o
fatídico dia em que minha sogra encontrou um cartão “incriminador” de
aniversário. Depois de uma discussão terrível, minha então namorada, que não
levava desaforo para casa, pegou algumas roupas e saiu de casa. Minha sogra
então – pasmem! – ligou para mim. Lembro que no turbilhão de coisas que ela
gritava, sempre repetia a seguinte – e estranhíssima – frase:
- Vocês
não são um casal! Casal é homem e mulher! Vocês são uma dupla! Uma dupla!
O
resultado? Fomos morar juntas. Diante do inevitável, a família dela passou a
nos convidar para jantares, festas de aniversário, natais. O tempo de
convivência foi tornando a todos mais tolerantes, estreitando laços. Minha
sogra me dava presentes. Ligava... Para mim:
- Ela tá
muito magrinha… Cuida dela pra mim, tá? Fala com ela… Você ela escuta…
Mesmo
muito tempo depois do casamento terminar.
Só existe
uma verdade: cada uma sabe onde lhe aperta o calo.
O cuidado
que devemos ter com as pessoas – com nós mesmas, mas também com os outros –
nunca pode ser abandonado. A benevolência tem que vir dos dois lados.
Com
relação a se assumir para a família, existem muitas coisas que precisam ser
pesadas.
Para que
arrombar uma porta se podemos abrir uma janela?
Até que
ponto vale a pena magoar quem amamos?
Que
postura devemos ter, que atitudes tomar para sermos respeitadas?
Como,
quando, por quê?
Tenho as
perguntas. As respostas são completamente subjetivas e pessoais.
Quanto a
se assumir na sociedade: Fazer por vontade? Fazer para chocar? Para que se
acostumem? Para termos visibilidade? Adianta dar murro em ponta de faca? Tem
como tirar a ponta da faca?
Quem pode
ditar o que é certo e o que é errado? Juízos de valor variam de acordo com o
local, a época, a pessoa.
Como sempre que lidamos com seres humanos, não
existem fórmulas. Na análise combinatória da vida, as possibilidades são
ilimitadas. Dependem de você, de com quem você está, de onde está.
É preciso
ser como o bambu, que não se quebra porque sabe envergar quando o vento sopra
forte demais.
Ser assumida
é muito mais do que andar de mãos dadas ou beijar na rua. Vai além, muito além
de uma simples – é simples, nós que complicamos – orientação sexual.
O
fundamental – e que não é fácil – é se assumir para si mesma. Saber, aceitar,
não ter medo de gostar de quem se é. Saber o nosso valor, acreditar, não
duvidar. Mesmo que todos digam o contrário. Isso é fundamental.
O
maravilhoso do ser humano é exatamente essa diversidade.
O que torna qualquer
um insubstituível é saber que entre bilhões de pessoas no mundo, não existem
duas iguais.
É a
diferença, a singularidade de nossa essência que nos faz precios@s, rar@s e
especiais.
Exatamente
por isso não importa se minha família sabe, se no meu trabalho sabem, se
ninguém ou se o mundo sabe. Não importa se eu bato no peito gritando:
- Sou
lésbica!
Ou se
prefiro não explanar. Se ando ou não de mãos dadas com minha mulher, companheira, amante, esposa, ficante ou
namorada. Se a beijo no meio da rua ou só em casa.
Não existem
regras.
Tudo que
vem de dentro, tudo o que nos faz feliz é válido.
Tudo que
nos faz sofrer precisa ser superado, mudado, transformado.
O que é
forçado… Sem comentários!
Ser
assumida é simplesmente quando ser quem e o que somos nos traz felicidade.
texto postado originalmente em 06 de Novembro de 2008 no site Parada Lésbica na extinta coluna Dizendo ao Que Vim de Diedra Roiz.
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Copyright © 2008 por Diedra Roiz
Todos os direitos reservados. Você não pode copiar (seja na íntegra ou apenas trechos), distribuir, disponibilizar para download, criar obras derivadas, adaptações, fanfictions, nem fazer qualquer uso desta obra sem a devida permissão da autora.
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